Eneias Ciências & Cogniçâo 2009; Vol 14 (3): 024-038 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cogniçâo
jogniçSo Submetido em 21/09/2009 | Aceito em 19/11/2009 | ISSN 1806-5821 - Publicado on line em 30 de novembro de 2009
criticism" (Sellars e Harman, 1970). Por outro lado, seguir uma regra é como responder a um
estimulo (o estado causal nâo é necessariamente consciente, como Sellars mostra na critica do
mito do dado ao fundacionismo clâssico).
Assim, a consciência (ou nâo) da regra é refletida em açôes de dois tipos: ought-to-be
e ough-to-do, respectivamente. As primeiras indicam como os agentes devem fazer (implicam
uma razâo), enquanto as demais o que os agentes devem fazer. Adultos possuem conceitos e
sabem aplicâ-los, ensinando às crianças as normas em que se deve usâ-los (cf. Sellars, 1969a).
Ora, regras ought-to-be emergem do discurso interno, contudo, nâo prescrevem
necessariamente uma açâo, mas o fato que o agente estâ em um estado espedfico consciente
dos conceitos envolvidos nessa circunstância, ou seja, ought-to-be referem-se a episôdios
intencionais de pensamento. Um pensamento qualquer significa que-P porque alguém pensa
que-P (o pensamento que-P é uma “mental assertion” que-P, um estado cognitivo). Porém,
cumpre observar a distinçâo entre uma crença e um pensamento: ter o pensamento que-P é um
estar em um estado mental consciente de que se estâ nesse estado, mas nâo necessariamente
acreditar que-P. A crença que-P é um estâgio posterior a pensar que-P e pode ou nâo ser
considerado pelo agente (Sellars, 1953, 2008; Sellars e Chisholm, 1957).
Aprender a reconhecer regras envolve compreender as entradas (padrôes de respostas
a estimulos que nâo sâo performances mentais), e as sa^das (resposta verbal ou
comportamental), ou seja, a capacidade de reconhecer estimulos como de certo tipo e de
responder a eles. Porém, pensar exige movimentos internos, transiçôes inferenciais
(intralinguistic moves) que nâo violam prindpios lôgicos e sâo realizados no “espaço das
razðes (ocorrem em padrôes ought-to-be, executadas por quem possui uma linguagem e
delibera em cima dela). Estes movimentos devem respeitar a lôgica, o pensamento deve evitar
movimentos que a contradiga: uma regra nâo especifica o que deve ser feito, mas o que nâo
pode ser feito, o comportamento que viola a regra (Sellars, 1949). É assim que a norma se
torna a expressâo da racionalidade, o comportamento inteligente é aquele que acompanha e
compreende as regras. Nas palavras do prôprio autor:
“[...] there towers a superstructure of more or less developed systems of rule-regulated
symbol activity which constitutes man's intellectual vision. [..] Such symbol activity
may well be characterized as free - by which, of course, I do not mean uncaused - in
contrast to the behavior that is learned as a dog learns to sit up, or a white rat to run a
maze. [.] A structure of rule-regulated symbol activity, which as such is free,
constitutes a man's understanding of this world, the world in which he lives, its history
and future, the laws according to which it operates, by meshing in with his tied
behavior, his learned habits of response to his environment. To say that man is a rational
animal, is to say that man is a creature not of habits, but of rules." (Sellars, 1949)
Aprender uma linguagem é aprender a obedecer a regras, mas nâo porque o padrâo
obriga a seguir regras, mas porque o padrâo é reforçado na comunidade. Aprende-se a seguir
regras ao mesmo tempo em que se aprende uma linguagem; aprende-se a pensar ao mesmo
tempo em que se aprende uma linguagem. “A habilidade de ter pensamentos é adquirida no
processo de aquisiçâo da fala publica e que somente depois que a fala publica estiver bem
estabelecida, pode a ‘fala interna’ ocorrer sem a culminaçâo expticita” (Sellars, 2008: 109).
Sobre isso, comenta Robert Brandom: “Uma vez que se tenha aprendido simultaneamente a
falar e pensar [...] o pensamento muitas vezes precede a fala na ordem da causaçâo” (Sellars,
2008: 171). Nota-se, assim, a profunda relaçâo entre o comportamento, linguagem e
pensamento:
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